Resenha: O Colecionador de John Fowles – Reflexões sobre o Patriarcado na Literatura
Classificação: ★★★★☆
*Obs: contém spoiler
Esse livro nos traz reflexões acerca de como o patriarcado está enraizado na sociedade, de como as classes com poder aquisitivo alto são privilegiadas, John Fowles retrata bem essas questões em seu romance : “O Colecionador”. O livro, a princípio, retrata o sentimento de superioridade e de preconceito advindo daqueles que tinham “boa educação” e linhagem rica.
O personagem principal ao se ver longe da possibilidade de se relacionar com a mulher “amada” devido a empecilhos financeiros, quando se depara em uma posição econômica “privilegiada” oriunda da aquisição de um bilhete premiado, ele planeja “inconscientemente”, uma visita que na verdade é, um sequestro.
O personagem, Caliban, com ajuda de clorofórmio - substância anestésica capaz de causar confusão mental ou torpor- traz sua “hóspede” para o porão de um sítio longínquo, adquirido a pouco tempo, com o suposto propósito de viver com uma tia e prima, todavia, observa-se que as atitudes de Caliban demonstram que seu objetivo real é de mantê-la confinada e a mercê de seus “caprichos”. A priori, o desenrolar da história nos leva a crer que os seus objetivos são puramente sexuais, mas na verdade, o escritor, John Fowles, nos mostra que Caliban, tem uma certa admiração, que tende a uma “adoração” doentia, que faz com que ele a mantenha ali, intocada. Miranda, a hóspede, nos mostra que não está disposta a ceder aos desejos de seu sequestrador, e utiliza de toda sua energia para se livrar de forma definitiva do agressor.
Miranda, uma bela jovem, estudante, apaixonada por arte, com uma carreira promissora e um futuro brilhante pela frente, ao se deparar enclausurada em um porão, se desespera, mas esse primeiro contato, traz um esboço do que devemos esperar da jovem. Suas atitudes permitem que consigamos vislumbrar com ela todas as possibilidades de fuga, sucesso, e uma ilusão, a possibilidade de vingança. A jovem sonha com a liberdade que está a algumas portas de distância, porém seu carcereiro, com vãs e vagas promessas assegura que essa “visita” terá duração de apenas alguns dias, ou semanas, mas que com certeza, a moça poderá contar com a liberdade que certamente virá, desde que ambos consigam estabelecer algum tipo de vínculo.
O livro mostra o quanto estava enraizado, o sentimento de superioridade dos homens com relação às mulheres, o machismo, e em alguns casos até, a misoginia, me atrevo a dizer que por mais que o sequestrador, em sua mente deturpada, acreditasse que em suas atitudes houvesse algum tipo de linguagem romântica, seu comportamento traduz os primórdios de uma possessividade, e agressividade, que Caliban não seria capaz de admitir, porém logo adiante, esse jovem vai se perder em seus próprios sentimentos, e a admiração e “carinho” por ele demonstrados, dão lugar a violência, e a tortura psicológica a que ele subordinou Miranda.
A hóspede se desdobra ao máximo para se desvencilhar de seu agressor, faz o uso vários mecanismo para tentar se ver livre, mas em certo ponto percebe serem vãs as suas tentativas, seu agressor não tem pretensão de libertá-la, dado isso, Miranda tenta fugir, se valendo de meios de sedução. O resultado dessas tentativas de fuga, instaurou um ambiente caótico entre eles, como forma de protesto, a jovem fez greves de fome, fingia doenças, até que por fim, de fato, Miranda pegou um resfriado, o culpado provável, Caliban.
A partir de então, o estado da jovem começou a se deteriorar o que parecia ser apenas uma gripe desencadeou uma possível pneumonia, a situação só piorava e Miranda vê tudo com que sonhou se despedaçar, agora já perto do fim, conseguimos sentir uma dor imensa ao ver os planos da moça frustrados, ela que lutou tanto, e no decorrer do livro nos emocionou com sua perspectiva crítica de mundo, suas paixões vividas e as dúvidas, muito comuns na fase juvenil. O livro desencadeia uma série de sentimentos no leitor, primeiro pensamos no quanto Miranda é tola, em seguida compreendemos que o meio em que ela está a torna mais frágil, porém disposta a lutar.
Fowles retrata em seu livro o que ainda perdura até os dias atuais, o quanto é falha a segurança das mulheres , ele exemplifica no livro a facilidade de raptar uma mulher, o quanto estão indefesas e a mercê de qualquer homem mal intencionado, ao fazer a leitura o leitor se coloca no lugar de Miranda, e sofre junto com a personagem que lutou, chorou e sofreu nessa trama fictícia que se assemelha tanto com a vida real, o colecionador provoca uma síntese de sentimentos no leitor, eu diria que revolta e empatia são os mais acentuados pelo romance.
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